domingo, 11 de novembro de 2007



Texto de Pedro Silveira, um dos líderes do protesto na FATEC

Combate às Fundações “de apoio” na UFSM!!!

O tempo trouxe a verdade à tona: nas últimas semanas, a comunidade assiste impressionada os escândalos de corrupção envolvendo as Fundações ditas de apoio e a Universidade Federal de Santa Maria. Muita gente graúda já caiu, e mais ainda cairão. Chegou a vez dos “intocáveis”, dos “magníficos”, “excelentíssimos”, pagarem por sua irresponsabilidade no trato com os bens públicos, bens de todos nós. Afinal, rico que rouba não merece perdão.

Em Junho deste ano, o Ministério Público Federal (MPF) passou a investigar o caso do convênio UFSM/INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), para a elaboração de um software e treinamento da equipe. Para desenvolver o projeto, a UFSM recorreu a FATEC (Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência), que ficou com a liberação dos valores, que recebia da UFSM os recursos do INEP. Entretanto, o INEP não aprovou a prestação de contas dos recursos repassados, pois o valor investido e gasto pela UFSM para a elaboração do projeto - R$ 4,3 milhões - pelo menos R$ 2,3 milhões não teriam relação com o produto final, segundo apontou o Tribunal de Contas da União (TCU). Dentre estes “gastos extras”, temos desde a compra de vinhos caríssimos até pacotes turísticos e churrascadas. Agora, atualização feita pela Justiça, mostra que no esquema foram desviados cerca de R$5,13 milhões dos cofres públicos. Isto levou a Justiça Federal a bloquear os bens do ex-reitor Paulo Jorge Sarkis e do ex-diretor do Centro de Processamento de Dados (CPD), Sérgio Limberger, que também contrataram empresas suas e de seus familiares sem licitação, com os recursos do convênio.
Nesta ocasião, o Movimento Estudantil da UFSM manifestou-se em frente a FATEC, lavando simbolicamente toda a sujeira da fundação, cobrando a punição dos envolvidos e questionando o caráter destas instituições privadas no seio das Universidades Públicas, reivindicando a Auditoria Pública das contas da FATEC.

Agora, para botar mais lenha na fogueira, as investigações da Operação Rodin nos levam novamente à indignação. Foi revelado que o Detran gaúcho (Departamento Estadual de Trânsito) contratava — sem licitação — a FATEC e a FUNDAE (Fundação Educacional e Cultural para o Desenvolvimento e Aperfeiçoamento da Educação e da Cultura), ambas ligadas à UFSM, para a avaliação teórica e prática na habilitação de motoristas. O serviço era prestado através da estrutura da UFSM, que entrava com sua estrutura física, servidores e pesquisadores (que possuem contrato de Dedicação Exclusiva com a Universidade). As duas fundações sub-contratavam ilegalmente outras empresas terceirizadas para prestar esse serviço no lugar delas, sendo que, a maioria dessas empresas tinha como donos pessoas ligadas à direção do Detran ou às fundações ou à UFSM.
Treze pessoas já foram presas, e apenas quatro liberados. Se indiciados, responderão pelos crimes de formação de quadrilha, fraude a licitações, tráfico de influência, sonegação fiscal, estelionato e peculato. A Polícia Federal anunciou que serão indiciadas entre 30 e 50 pessoas.
Dos quatro presos de Santa Maria, Luciana Carneiro e Dario Trevisan (o todo poderoso da Coperves) foram liberados. Já o Sarkis é citado nas decisões da Justiça Federal como peça fundamental na organização dos esquemas, utilizando-se de sua influência política.

Esta fraude envolvendo o Detran gaúcho e a UFSM, por meio da FATEC e FUNDAE, no processo de confecção de carteiras de motorista superfaturadas, além dos R$44 milhões roubados da população gaúcha, expressa o perigo e as relações promiscuas acarretadas pela lógica inerente às Fundações Privadas, da submissão do público aos interesses particulares e da corrupção em potencial.
Novamente os estudantes não ficaram calados e mobilizaram-se na FATEC nesta quinta-feira (08-11), em defesa da Universidade Pública, Gratuita e Democrática. Desta vez o ato foi mais que simbólico.

Confira a cobertura da mídia:
Do Diário de Santa Maria, Sexta-feira, 9 de Novembro de 2007-11-10:
Revolta contra a Fatec
Eram 13h30min da tarde de ontem quando um grupo de estudante com faixas, panelas e apitos enveredou em direção à Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência (Fatec), no campus da UFSM.
Chegando lá, os manifestantes foram avisados que não poderiam entrar. Foi então que os estudantes derrubaram o portão, quebraram uma das portas de acesso à Fatec e picharam os vidros e as paredes do prédio.
A revolta dos alunos se deve às denúncias da suposta fraude nos contratos com o Detran desvendada pela Polícia Federal na terça. No dia anterior, o grupo já havia espalhado faixas pelo campus em repúdio ao escândalo.
O tom do protesto era dado pelas palavras de ordem e pelas frases nas paredes: “Pichar é crime num país onde roubar é arte”; “Fazemos Alianças, Trambiques, Engodo e Conluios” (usando a sigla da instituição para fazer ironia). Assim que os manifestantes entraram na Fatec, o reitor da UFSM, Clovis Lima, e o vice-reitor, Felipe Müller, chegaram. O reitor pediu calma aos alunos, que o cercaram reclamando por providências em relação ao escândalo envolvendo a Fatec e para questioná-lo se haveria “represália” quanto à quebra da porta da fundação.
– O ato em si é legítimo, mas temos de preservar o patrimônio público – disse Lima. (Nota: aquele patrimônio é Privado!!!)
– O prejuízo que a gente causou é muito menor do que os R$ 40 milhões que a população gaúcha sofreu – argumentou um dos organizadores do protesto, Pedro Silveira, referindo-se ao R$ 44 milhões que teriam sido desviados na fraude.
Os estudantes conversavam com o reitor quando a Brigada Militar apareceu. Os manifestantes não gostaram da presença dos policiais e avisaram que não haveria negociação se a Brigada permanecesse em frente à Fatec. Em coro, eles começaram a gritar:
– Polícia é pra ladrão, não é pra estudante, não.
Lima pediu para os policiais se retirarem e continuou dialogando com os estudantes. Às 14h, estava marcada uma reunião do Conselho Superior da Fatec mas os integrantes foram barrados.
Com a saída do reitor, Müller assumiu as negociações com os alunos. Eles queriam participar da reunião, mas o vice-reitor explicou que, segundo o regimento da Fatec, não era possível. Já passava das 15h quando os estudantes deixaram o local e, então, os conselheiros puderam entrar para a reunião. Müller prometeu que os estudantes não serão penalizados pelo que fizeram ao prédio.


Mas nós avisamos...


Há muitos anos o Movimento Estudantil vêm denunciando as Fundações Privadas, no interior da UFSM. Não havia ainda a deflagração dos esquemas de corrupção que temos visto agora. É apenas a confirmação de nossas suspeitas.

Sempre afirmamos que as Fundações são o câncer da universidade pública. Sob o argumento da “desburocratização e auto-financiamento”, na prática são o principal instrumento de privatização interna das universidades, direcionando-as ao mercado. Existentes há décadas, mas regulamentadas apenas em 2004, somente a partir desta data passaram a prestar contas às universidades das quais se utilizam.
No período em que estivemos a frente do DCE-UFSM pedimos vistas e tentamos barrar a prestação de contas da Fatec no Conselho Universitário por três vezes, dado a sua intransparência e ilegitimidade. Ocasiões estas em que fomos vaiados pelos demais conselheiros (a maioria destes, vinculados organicamente com a reitoria e a Fatec), taxados de irresponsáveis, além de sofrermos ameaças de processo administrativo. E agora? Quem estava com a razão? Quem deve ser punido?!?

Neste mesmo momento, em Abril de 2007, já questionávamos no Consu e no jornal do DCE “Seria a relação Fatec/Detran um apoio necessário para a UFSM? Pois a Fatec prestou serviços ao Detran recebendo por eles cerca de R$ 33 milhões”. E fomos ignorados. Da mesma forma, denunciávamos que muitos dos integrantes do conselho e da diretoria da Fatec também eram membros da reitoria e dos conselhos superiores da UFSM (o que segundo a Constituição Federal contraria a moralidade administrativa, havendo conflito entre interesses públicos e particulares), o mesmo que aprova suas contas. Fácil entender porque zombaram-nos. Eles nunca questionariam nada, pois iriam contra seus interesses econômicos particulares.
Também cobrávamos há um bom tempo a realização de uma Auditoria Pública da Fatec. Frente a todos os ocorridos, foi definido a realização de uma auditoria externa na Fatec, que deverá ser feita por uma empresa contratada por licitação (achamos isso problemático...). Também foi aprovada a uma revisão em todos os contratos da fundação, que tem 400 projetos em execução. O que mais descobriremos?

Infelizmente agora, o DCE está nas mãos da direita (PDT, PMDB, PTB). O contra-movimento estudantil que eles protagonizam enfraquece nossas lutas. Mais do lado da reitoria do que dos estudantes, eles não questionam as fundações privadas, apenas defendem a sua “limpeza”, chegando inclusive a propor um certo “entendimento” entre o MPF, UFSM e FATEC nos jornais da cidade.
Isto não nos impede de construir lutas, por isso seguimos nos organizando e debatendo nossas pautas e intervenção na universidade, articulados com os demais setores estudantis. Entretanto cobramos democracia no movimento estudantil e assim exigimos a realização da Assembléia Geral dos Estudantes para definir o posicionamento do DCE, afinal eles nos representam perante a instituição.

Assim, seguiremos na luta, construindo uma campanha

Em defesa de uma Universidade Pública, democrática e transparente!

Perante estes abusos, acreditamos ser necessário que os estudantes novamente se mobilizem em torno desta questão. Defendendo a Universidade Pública, Gratuita e de Qualidade (baseada no tripé ensino-pesquisa-extensão), livre de corrupção, que não se submeta a nenhum tipo de entendimento que comprometa o público em favor do privado.

• Foto de Charles Guerra/RBS

Um comentário:

Palude1986 disse...

Por mais insidiosas que sejam as atuais suspeitas envolvendo a Fundação e a Universidade, não se deve utilizar isso para criticar os acordos realizados entre as instituições públicas de ensino superior e as entidades privadas.

Os fundos oriundos de tais contratos são extremamente relevantes e importantes para as universidades. Constituem grande incentivo e apoio à pesquisa, e também contribuem para a formação de uma instituição voltada à satisfação do mercado.

Constitui uma forma de propaganda ideológica de baixo calão utilizar o escândalo para criticar a aliança universidade-entidades privadas. Se realmente aconteceram, os desvios, estes se deram por causa da natureza privada da Fundação, por causa da natureza pública da universidade, por causa da falta de vigilância, ou por causa da natureza moral dos envolvidos no caso?