São casas simples / Com cadeiras na calçada / E na fachada / Escrito em cima que é um lar (Gente Humilde – Garoto, Vinicius de Moraes, Chico Buarque).
Há alguns dias, comentei o estudo realizado pelo Ministério das Cidades sobre a questão habitacional nas metrópoles do país. Embora os indicadores sociais brasileiros tenham melhorado nos últimos anos, o direito fundamental à moradia – indispensável para a consolidação de outros direitos, como saúde, segurança, lazer, etc. – ainda é negado à grande parte da população.
Como Jacques Alfonsín sempre enfatizou, a efetivação do direito à moradia está diretamente ligada à luta pelo acesso à terra. A democratização da propriedade urbana é indispensável para a solução do problema. Isso implica, sobretudo, no enfrentamento daqueles que detêm hoje o domínio exclusivista sobre os bens que são necessários a todos: os grandes proprietários.
Segundo o especialista em Direito Urbanístico, Edésio Fernandes, o deficit habitacional no Brasil, em 2006, girava em torno de 7,2 milhões de unidades residenciais, ao passo que, somente nas grandes cidades, havia cerca de 5 milhões de imóveis vazios. O combate à concentração da propriedade urbana deveria ser, portanto, a prioridade de qualquer política voltada para a habitação social. Entretanto, os governos – quando, acossados pela pressão dos milhares de sem-teto, tentam atacar o problema – seguem desenvolvendo programas de assentamento em regiões afastadas, sem infra-estrutura, com a construção de moradias precárias ou de valor excessivamente elevado.
Ou seja, preferem um modelo de assentamento altamente dispendioso, segregador e de pouca efetividade do que enfrentar a estrutura fundiária urbana reprodutora de exclusão social.
A política de habitação social – assim como a reforma agrária – não pode se resumir ao assentamento de sem-tetos, mas deve envolver um conjunto de medidas integradas cujo fundamento é combater a lógica de exclusão que o mercado imobiliário impõe às cidades. Para tanto, deve contemplar, no mínimo: a desconcentração da propriedade urbana, com o enfrentamento dos grandes proprietários; sua distribuição de forma a evitar a segregação territorial e, por fim, a efetiva democratização da cidade, com o desenvolvimento de alternativas sustentáveis de desenvolvimento local.
Tais medidas poderiam ser tomadas sem a necessidade, sequer, de alterações legislativas. O ordenamento jurídico brasileiro já traz instrumentos hábeis a promover uma reforma urbana nesses moldes. O que falta é a disposição em usá-los.
Seguirei abordando o tema, tratando de questões que julgo fundamentais para a construção de uma cidade democrática.
• Referências:
FERNANDES, Edésio. A nova ordem jurídico-urbanística no Brasil. in: ALFONSÍN, Betânia & FERNANDES, Edésio (org.). Direito Urbanístico. Estudos brasileiros e internacionais. Belo Horizonte: Del Rey, 2006;
ALFONSIN, Jacques Távora. O acesso à terra como conteúdo de direitos humanos fundamentais à alimentação e à moradia. Porto Alegre : S.A. Fabris, 2003.
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