quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Legalidade da política de cotas é incontestável


As ações judiciais questionando as ações afirmativas nas Universidades Federais vêm sendo, uma a uma, derrotadas nos tribunais. Recentemente, uma medida liminar que suspendia a reserva de vagas na UFSC foi derrubada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. No dia 24 de janeiro, a Justiça Federal negou o pedido de seis vestibulandos da UFRGS que se sentiram prejudicados pelo sistema de cotas da Instituição.

Em Santa Maria, o sistema de reserva de vagas também foi questionado, no entanto, por outros motivos. Conforme reportagem do Diário de Santa Maria, no dia 16 de janeiro, a Defensoria Pública, representando cinco vestibulandas afro-descendentes, impetrou Mandado de Segurança questionando a exigência do ponto de corte para cotistas. A antecipação dos efeitos da tutela, requerida na ação, foi rechaçada em primeira e segunda instância. Embora o mérito da causa ainda esteja em apreciação do Judiciário, o indeferimento da liminar indica a tendência de que sejam mantidos os termos do edital do concurso vestibular.

A manutenção do ponto de corte para os cotistas é, sem dúvida, uma falha da resolução que instituiu as ações afirmativas na UFSM. Se a intenção da política de cotas é garantir a diversidade étnica e cultural nas salas de aula, através do ingresso de afro-descendentes, indígenas e egressos de colégios públicos, a possibilidade das vagas não serem preenchidas, mesmo havendo candidatos, é um contra-senso. Na análise mais completa do tema feita até aqui, Cesar Jacques apontou o problema. Os próprios responsáveis pela proposta reconheceram publicamente a necessidade de alterar esse ponto específico, de modo a garantir a efetividade das cotas, o que deverá ser feito pelo Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão da Universidade, com vista ao vestibular de 2009.

Em que pese tudo isso, não poderia ter sido outra a decisão da Justiça no caso em questão. A legalidade das ações afirmativas reside na autonomia, constitucionalmente garantida, que as Instituições de Ensino Superior têm para instituírem os critérios de ingresso, o que compreende a exigência – ou não – de uma pontuação mínima. O questionamento do ponto de corte implica no questionamento da capacidade da UFSM fixar os seus próprios critérios de ingresso, argumento utilizado por aqueles que combatem a política de cotas.

No más, defendo que as ações afirmativas da UFSM precisam ser aperfeiçoadas, especialmente pela abolição do ponto de corte. Contudo, é muito cedo para taxar a política de cotas instituída como “engodo” ou de “jeitinho santa-mariense para expressar o racismo incutido no ambiente acadêmico”. Primeiro, porque não temos ainda os resultados do vestibular, portanto não sabemos se as cotas foram ou não preenchidas. Segundo, porque quem lutou pelas ações afirmativas da UFSM sabe o quanto foi difícil aprovar o sistema hoje vigente (para quem quiser recordar). Talvez, sem o ponto de corte, naquele momento, não conseguiríamos. Foi uma vitória circunstancial, não foi a vitória final. Mas, sobretudo, foi uma vitória e é muito cedo para desqualificá-la.
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• Foto de Thiago Medeiros

Um comentário:

Tomacaúna disse...

Acidentalmente, travei contato com uma das autoras da ação. Além de corrigir a reportagem do DSM - são 4 autoras e não 5 -, ela argumentou fortemente contra o sistema adotado pela UFSM. Convidei-a a escrever um texto a respeito que, em breve, será publicado aqui.